O dilema de François Bayrou
Mesmo sem passar à segunda volta, François Bayrou conseguiu ontem uma vitória notável. Diz a maioria dos comentadores que ele fez «renascer o centro.» Mas a verdade é que Bayrou enfrenta, agora, particulares dificuldades para traduzir o seu sucesso em algo de politicamente consistente.
Pela primeira vez na Quinta República, um candidato centrista consegue um resultado apreciável com recurso a votos vindos da esquerda. (Saliente-se, para compreender a dimensão do sucesso de Bayrou, que o seu resultado é melhor do que os de Lecanuet (1965), Barre (1988) ou mesmo Balladur (1995), e só ultrapassado por Giscard d’Estaing em 1974 e 1981, mas este beneficiando, na primeira eleição, do apoio de grande parte do partido gaulliste e, na segunda, do facto de se recandidatar como Presidente em exercício.) Com efeito, tradicionalmente, o centro em França obtém os votos dos descontentes de direita. Foi assim, em particular, no tempo de Chirac, como o prova aliás o resultado de ontem de Sarkozy, muito mais elevado do que conseguiu actual Presidente na primeira volta das quatro eleições em que participou.
Ontem, as coisas passaram-se de forma diferente. De acordo com sondagens já realizadas, os eleitores de Bayrou provêm, de forma mais ou menos igual, da direita e da esquerda e, quanto às suas intenções de voto para a segunda volta, distribuem-se também de forma equivalente, entre Nicolas Sarkozy e Ségolène Royal.
O que dá bem a ideia do problema quase insolúvel que se coloca a François Bayrou. Num mundo ideal, o melhor caminho seria nada dizer – não dar indicação precisa de voto para a segunda volta. Qualquer coisa deste género: «Não sou proprietário dos votos dos meus eleitores, eles que decidam. Não fizemos esta campanha contra o sistema para vir depois aceitar a bipolarização institucional e todas as suas consequências.» Só que, para existir, Bayrou precisa de traduzir os seus votos de ontem em votos nas legislativas de Junho, que se seguirão às presidenciais. Idealmente, o que lhe conviria era que o novo Presidente precisasse dos votos do centro para governar: que nenhum dos partidos tradicionais (UMP ou PS) obtivesse maioria absoluta nessas legislativas.
Mas isto é extremamente difícil. Os deputados da UDF, nos diversos distritos eleitorais, são normalmente eleitos graças aos votos da direita. Com efeito, tendo em conta o sistema eleitoral francês, acontece que, na grande maioria dos casos, os deputados do partido de Bayrou defrontam-se, na segunda volta, com candidatos da esquerda. Mesmo que Bayrou estivesse disposto a esquecer este facto, com base numa dinâmica de vitória assente nos resultados de ontem, não é certo que os deputados do seu campo o sigam nessa estratégia. O que reduz consideravelmente o leque de opções à disposição do candidato centrista.
Dir-se-ia que a única solução possível seria a audácia – com um novo partido centrista, Bayrou e os seus adeptos atacar-se-iam à bipolarização política tradicional. Mas para isso seria necessário um novo sistema eleitoral.
Assim, mesmo se os resultados de ontem parecem dar conforto a Bayrou, na análise que faz dos problemas do sistema político francês (recusa do bipartidarismo e desejo de reforma institucional), é difícil ver como pode ele na prática capitalizar o seu sucesso. Raras vezes, a pergunta «Que farei com estes votos?» teve uma resposta tão difícil.
1 Comments:
François Bayrou deve ter motivos de se sentir orgulhoso. E de certa forma "divertido" com o namoro que tanto aesquerda e a direita lhe irao fazer nas próximas semanas. Este "triangle amoureux où il tiens la chandelle" vai certamente criar alguns sobressaltos nos dois principais candidatos e será digno de uma das melhores intrigas políticas "comme à la Cour du Roi".
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