sábado, 4 de julho de 2009

José Manuel Fernandes e Maria João Pires - um pouco de vergonha

Leio e não acredito. José Manuel Fernandes escreve isto a respeito de Maria João Pires na rubrica Sobe e Desce do Público de hoje:

«É uma grande artista, talvez a melhor pianista portuguesa de sempre. Belgais era um projecto generoso e bonito. Mas isso tudo não lhe dá apenas direito ao reconhecimento dos portugueses, cria-lhe obrigações para com o seu país. Podia ter continuado a lutar, mas preferiu trocar de nacionalidade. Perdeu a razão, senão o respeito.»

Gostaria de saber, em primeiro lugar, quais são as obrigações que Maria João Pires tem para com o país? Porque, se algumas tivesse, certamente já as teria cumprido. Contribuiu para o prestígio internacional de Portugal e podendo, de há muito, ter-se exilado no estrangeiro, como o fizeram, e fazem ainda, muitos artistas ou cientistas nacionais (que não encontram aqui as condições para exercerem a sua actividade – situação que José Manuel Fernandes está farto de denunciar!), envolveu-se, em Belgais, num projecto educativo inovador de ensino da música, o tal «projecto generoso e bonito». E aí, confrontou-se com a máquina administrativa dum Estado e Governo insensíveis a argumentos que ultrapassem as regras estabelecidas nos regulamentos burocráticos que o Director do Público está sempre a criticar e que considera responsáveis pelo afogamento da iniciativa e inovação no nosso país. Por isso, Maria JoãoPires desistiu. Fartou-se; foi-se embora!

Porque não pensar, pelo contrário, nas obrigações que Portugal tem para pessoas que, pela sua arte, pela sua vida, o honraram? Jorge de Sena e Adolfo Casais Monteiro passaram, com tristeza, a sua vida fora daqui porque nunca lhes foram dadas condições para cá ficarem. Helena Vieira da Silva assumiu a nacionalidade francesa e só se reconciliou com Portugal nos últimos anos da sua vida. Eduardo Lourenço vive em França. Podia multiplicar os exemplos. Posso até, para não dizerem que sou elitista, falar de Cristiano Ronaldo. É certo que o jogador beneficiou do trabalho da Academia do Sporting (um exemplo excepcional por estas bandas) mas alguém tem dúvidas que, se se tivesse mantido em Porugal, nunca seria o jogador que hoje é?

O caso de Maria João Pires não é único. Longe disso. Perdeu o respeito? O respeito de quem? O meu não! Os dos seus congéneres, dos artistas que com ela trabalham, da crítica, também não! Basta ver os artigos que lhe foram recentemente consagrados nas revistas musicais Diapason ou na Classica Répertoire.

Afinal, Maria João Pirs perdeu apenas o respeito de José Manuel Fernandes... Pode viver bem melhor sem ele.

PS Só continuo assinar o Público porque vivo no estrangeiro e o Diário de Notícias não tem assinatura exclusivamente elecrónica...