domingo, 7 de junho de 2009

Gordon Brown

A única razão por que cheguei a gostar de Gordon Brown era negativa: ele vinha substituir Tony Blair. Agora, assisto, como todo o resto do mundo, ao esboroamento da sua autoridade e à implosão do seu Governo. A remodelação ministerial que acaba de fazer está longe de ser a que desejava mas o seu poder, neste momento, não lhe permite ir mais longe. Se não houver uma rebelião entre os deputados trabalhistas (os chamados backbenchers), a começar segunda-feira depois de serem conhecidos os resultados do Labour nas eleições europeias (que se afiguram desastrosos como o foram os das eleições regionais de quinta-feira), Brown será Primeiro-Ministro até Junho de 2010, à espera da improvável possibilidade de recuperar o prestígio duramente afectado.

Há muito de culpa sua nesta situação. Ele é um control freak (não encontro em português expressão que defina melhor esta mistura de mando, influência e ocas tentativas de dominação que se exercem, infelizmente, mais sobre a forma e a comunicação das políticas do que sobre o seu conteúdo – aviso sobre o qual Sócrates devia meditar) e também um homem capaz de propagar rumores desagradáveis e impróprios a propósito dos seus inimigos e, o que é ainda mais grave, dos seus amigos políticos, quando estes fazem qualquer coisa que lhe desagrade, ou de, sempre por interpostas pessoas, lhes dirigir inaceitáveis insultos – e isto apenas com o fito de alijar as suas próprias responsabilidades. Tem, obviamente, algumas qualidades: ninguém duvida do poder da sua inteligência e a sua actuação, nestes tempos de crise financeira, mereceu elogios vindos de diversos quadrantes. Mas há, claramente, deficiências pessoais que o impedem de ser um Primeiro-Ministro eficaz. Por outro lado, pese embora esse formidável intelecto, ele tem parecido tão preocupado em apagar pequenos incêndios, normalmente iniciados por membros do seu próprio Partido, que não se lhe reconhece, à parte as suas intervenções relativas à situação financeira internacional, nenhuma verdadeira iniciativa política real e, muito menos, inovadora. Mais do que agir, ele parece limitar-se a reagir – e a reagir mal e apenas sob pressão.

Isto dito, não deixa de me espantar a facilidade com que os adeptos de Tony Blair têm, nestes últimos dias, lançado ataques contra o Primeiro-Ministro que só podem qualificar-se de reles e traiçoeiros. Uma delas chegou ao ponto de demitir-se no dia anterior ao das eleições – não conheço caso parecido de perfídia política! Será que essa gente não compreende que o afastamento de Brown implicará certamente a realização de eleições gerais (é constitucionalmente possível, mas difícil de aceitar politicamente, que um segundo Primeiro-Ministro trabalhista possa governar sem se submeter ao eleitorado: recorde-se que Brown não foi eleito mas se limitou a substituir Blair quando este se demitiu) e que estas se traduzirão numa autêntica razia do Labour (novo ou velho). Isso mesmo parece ter sido compreendido por Peter Mendelson, amigo e aliado do antigo Primeiro-Ministro, que tem defendido, mesmo se não acredita que Brown seja um vote winner, que a sua manutenção à frente do Governo é essencial para dar ao partido, senão a vitória nas próximas eleições, pelo menos a possibilidade dum resultado que não seja calamitoso.

Termino com um comentário adicional e uma citação.

O comentário tem a ver com o que será um novo governo tory, dirigido por David Cameron: um governo conservador, profundamente antieuropeu, que nos levará de volta aos anos de Tatcher, embora obviamente com um verniz moderno. Bela perspectiva!

A citação – que não resisto a transcrever – é uma frase proferida no Parlamento por Vincent Cable, do Partido Liberal-Democrata, quando Brown, depois dum início prometedor, começou a ser alvo de crítica generalizada e a descer abruptamente nas sondagens de opinião: «The House has noticed the Prime Minister’s remarkable transformation in the last few weeks from Stalin to Mr Bean.» Coisas destas só se ouvem na Câmara dos Comuns, com a sua tradição de dotes oratórios e onde os deputados têm de mostrar trabalho para poderem demandar novos mandatos.