O Riso Amarelo dos Portugueses

Mas até este recurso tímido à anedota parece hoje estar proscrito. Ainda não tínhamos recuperado do choque de saber que um professor que prestava serviço na Direcção Regional de Educação – Norte (DREN) tinha sido objecto de um processo disciplinar, tinha visto a sua comissão de serviço cessar abruptamente e tinha sido obrigado a regressar, dum dia para o outro, à sua escola de origem, às suas aulas de inglês (e, ao que parece, a DREN não remeteu a tempo a esta escola as suas classificações de serviço, impedindo-o, na prática de concorrer para professor titular), como acabamos agora de saber que o Ministro da Saúde - ou um serviço por ele - acaba de demitir a directora do Centro de Saúde de Vieira do Minho por ela se ter recusado a abrir processo disciplinar contra um médico que terá afixado, nas paredes do centro, algumas declarações do Ministro (ou será que tenho que dizer, atento, venerador e obrigado, Senhor Ministro) acompanhadas de comentários jocosos. Repare-se que não foi a directora do centro que escreveu ou divulgou os comentários e que o próprio médico que o fez já se acusou e assumiu a responsabilidade dos seus actos; e que a directora em causa, logo que lhe foi comunicado o incidente, mandou corrigir a situação e retirar a fotocópia pregada na parede, repreendeu verbalmente o culpado do incidente e apenas se recusou a iniciar procedimento disciplinar, considerando o assunto encerrado. (E pensar-se-ia, num país de gente normal, que mereceria, por esta atitude de simples bom senso, um louvor em vez de uma repreensão - para não falar na demissão que lhe caiu em cima!)
Com base nestes factos, o Ministro concluiu que aquela senhora, cuja competência profissional é reconhecida mesmo pelo seu sucessor, um vereador do PS da Câmara de Ponte de Barca apressadamente nomeado, não reunia «as condições para garantir a observação das orientações superiormente fixadas para prossecução e implementação das políticas desenvolvidas pelo Ministério da Saúde.» (Ufa!) E o assessor de imprensa da Administração Regional de Saúde do Norte declarou que a mesma senhora tinha sido demitida «porque quebrou o dever de lealdade.» Deve notar-se aliás que o dever de lealdade dos funcionários públicos é para com as instituições e não para com os ministros...
Se não fosse grave, daria simplesmente vontade de rir. Mas é grave. Esta gente é demitida, vai ser obrigada a contratar advogados, vê as suas carreiras, a sua evolução na profissão, comprometidas - para não falar desta coisa extraordinária de ser posto na rua num minuto, como se tratasse de matéria dispensável. Em outros tempos, dir-se-ia como se fosse uma mulher a dias mas parece que, agora, até as mulheres a dias são despedidas com mais cuidados.
Continuem assim! Façam favor!... mas depois não se queixem de que o país ande triste. E tão triste que, por estas e por outras, nas próximas eleições, possa ser capaz capaz de dar um pontapé de despeito a este governo caracterizado por tão disparatados níveis de intolerância.
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