quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Páre, escute e olhe - Uma pequena ideia para Portugal

Uma das coisas que mais me irritou nestas curtas férias passadas no pequeno torrão plantado à beira-mar foi a arrogância de certa gente a quem, não se sabe porquê, se deu entrada nos jornais e nas televisões. Quero aliás apresentar as minhas desculpas a Helena Matos, cronista no Público que aqui critiquei recentemente. Com efeito, ao lado da maioria dos que agora por aí andam a considerar-se cronistas ou fazedores de opinião, ela pode com alguma justiça ser considerada como um modelo de equilíbrio. Por exemplo um artigo numa edição de domingo do Diário de Notícias, de que não guardei cópia tal o nojo que me provocou, numa rubrica chamada «O Sexo e a Cidália», apresentava opiniões, expressões e palavras de que nem o José Vilela que, nos meus tempos de miúdo e adolescente, escrevia e desenhava os textos de revistas bastante ordinárias, se lembraria – e tudo isto em lugar de honra num jornal com o DN

Mas o que principalmente me aflige é a forma como essas senhoras e esses senhores pensam saber tudo. Parecem todos formados na escola do «Nunca tenho dúvidas e enganar-me está fora de questão», que foi, noutros tempos, apanágio de Cavaco Silva (e mesmo assim, quando pronunciou estas palavras que fizeram data, o actual Presidente teve o cuidado de confessar que, às vezes, embora muito raramente, até ele tinha dúvidas!)

Vem isto a propósito doutra crónica, dum jornalista cujo nome esqueci, também publicada no Diário de Notícias, sobre o limite de velocidade de 50 km/hora recentemente imposto em certas vias, avenidas e ruas de Lisboa. Embora tendencialmente favorável a medidas como esta, concedo que esta questão dos limites de velocidade, e de fixá-los nos 50 km/hora, merece discussão - não é evidente que tenha sempre razão quem os defende. A mim parece-me, mas sublinho que se trata somente duma opinião, que a maioria dos estudos mostra que a limitação de velocidade é geralmente acompanhada duma importante diminuição do número e da gravidade dos acidentes rodoviários; e, por isso, que é batalha perdida a dos que se lhe opõem porque, nos tempos de hoje, basta que uma só morte seja atribuída a excesso de velocidade (e como negá-lo?) para que, mais tarde ou mais cedo, todos tenhamos que nos habituar a conduzir mais devagar. Mas tudo isto deve ser discutido e pesados os prós e contras de cada posição! Agora, o que é seguramente errado é que alguém trate uma questão como esta na base duma imputação de motivos financeiros à Câmara de Lisboa (as multas serviriam, segundo o jornalista, para encher as caixas vazias do município chefiado por António Costa), usando frases bombásticos do género «abaixo os ladrões» e recusando sequer considerar a possibilidade de que a medida em causa possa ser ditada por motivos racionais e ter efeitos positivos. Eu, por exemplo, assisti na televisão a uma conversa com um oficial da Brigada de Trânsito que dizia nada ter a opor aos GPS que indicam a posição dos radares porque o objectivo principal da instalação destes era o de obrigar os automobilistas a reduzir a velocidade - o que seria conseguido mesmo se eles fossem advertidos da sua posição pelo sistemas de localização geográfica.

Tudo isto para dizer que, em Portugal, temos certezas a mais! E também pressa: veja-se a decisão recente do Ministério da Administração Interna de impor o controlo de drogas aos automobilistas sem exceptuar de tal controlo, por exemplo, calmantes e antidepressivos que muitas pessoas tomam por indicação médica – só para ter que vir a corrigir-se, de forma algo ridícula poucos dias depois. Há a ideia – que Cavaco Silva, enquanto Primeiro-Ministro muito fez para firmar nas mentes lusitanas – que o pior de tudo é a inacção. É como as reformas, pelo menos na linguagem e no pensamento de Sócrates: elas são o contrário do imobilismo e, por isso, sempre positivas (favorecem a criatividade, a inovação, o espírito de iniciativa e o empreendedorismo – palavra que felizmente não existe em português mas corre o risco de ser criada por repetição abusiva!) Ora, muito ganhariam os portugueses se parassem uns tempos para pensar e consagrassem alguns momentos da sua vida a ouvir os outros. (Quem me conhece, poderá dizer: «Bem prega Frei Tomás!» Mas isso é outra conversa.)

Parar, escutar, olhar! Quem diria que o dístico das passagens de nível da CP teria aplicação no domínio da política nacional?