domingo, 3 de agosto de 2008

Júlio Pomar

O Diário de Notícias publica, na sua edição de hoje, uma entrevista de Júlio Pomar. Não sei qual o pretexto (não se trata do seu dia de anos, já que Pomar nasceu a 26 de Janeiro de 1926), nem a entrevista, pelo menos na versão reduzida que aparece on-line, parece muito interessante. Mas dá-me a oportunidade de saudar um dos maiores pintores portugueses (e ainda vivo) e, com a possível excepção de Paula Rego, num estilo totalmente diferente, o meu preferido. De salientar que os dois últimos Presidentes da República, Mário Soares e Jorge Sampaio, escolheram precisamente estes pintores (Soares, Pomar; Sampaio, Rego) para efectuarem o tradicional retrato presidencial, dando à galeria do Palácio de Belém uma imaginação, um colorido e uma ironia a que ela não estava, de certeza, habituada. (Isto embora José Augusto França tenha dito, a propósito do retrato de Soares por Pomar, que não se compreendia a sua exposição naquela sala!)

Ao lado, a gravura que Pomar executou em 1979 para ilustrar a capa de O Burro em Pé, que inclui Dinossauro Excelentíssimo, de José Cardoso Pires. (Segundo me parece, a capa da edição original, de 1972, do Dinossauro Excelentíssimo, que a Wikipédia define como uma «fábula satírica que retrata a vida de Salazar, a sua ditadura e o Portugal do Estado Novo num tom bastante irónico e amargurado», era de Abel Manta. De qualquer maneira, como quase tudo o que escreveu José Cardoso Pires, vale a pena ler este livro. Entre parênteses, vi agora numa livraria aqui em Bruxelas, a tradução de De Profundis, Valsa Lenta, que escreveu depois do seu AVC, incluindo ainda o prefácio de João Lobo Antunes.)

A cara afilada do Salazar dos anos sessenta, o fato preto, são bem a mostra de como andávamos na altura: mais do que a amargura imperava o desespero. Como dizia Alexandre O'Neill:

Portugal, questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso, fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa
meu remorso,
meu remorso de todos nós.