Provedor de Justiça
Não se vê como podia encontrar-se personagem mais consensual para ocupar o cargo de Provedor de Justiça do que Jorge Miranda, meu antigo professor de Direito Constitucional, deputado à Assembleia Constituinte de 1975 e comummente considerado, pela influência que nela exerceram as suas ideias, como o «pai» da Constituição Portuguesa. Para além disso, Jorge Miranda, antigo membro destacado do PSD, quando este partido era ainda o partido de Sá Carneiro, não se coibiu de criticar o governo e a maioria socialistas em aspectos tão importantes como a lei da interrupção voluntária da gravidez ou a ideia, ainda não concretizada, do casamento homossexual. Não estou de acordo com ele em nenhuma destas suas posições mas parece-me que elas provam que nada, na sua maneira de estar na vida, na sua experiência e actividade políticas, pode levar a pensar que ele viesse a andar a reboque do Partido Socialista. Pelo contrário: trata-se de uma personalidade independente, com quem se concorda ou de quem se discorda, mas a quem sempre se respeita. A recusa do PSD em apoiar esta nomeação, devida apenas a uma ideia abstrusa de que lhe competiria indicar o nome do próximo Provedor, apenas conduz a um bloqueio institucional que seria ridículo se não fosse grave. O mandato de Nascimento Rodrigues já terminou há mais de oito meses e o actual Provedor está de baixa médica há dois meses.
A função do Provedor de Justiça é importante no quadro constitucional e legal português. Para a pequena história, conto aqui que, uma vez, em Bruxelas, em minha casa, o meu sogro, Ângelo de Almeida Ribeiro, na altura o Provedor de Justiça, foi confrontado por telefone com declarações de alguém que era, ao tempo, Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, e que tinha posto em causa a sua intervenção num assunto qualquer, de cujos aspectos já não me recordo. Mas lembro-me da sua resposta. Em termos aproximados, ele limitou-se a dizer ao jornalista que o tal Secretário de Estado não tinha qualquer ideia dos poderes e deveres do Provedor e da ordem jurídica constitucional. O nome desse Secretário de Estado de Cavaco Silva: Oliveira e Costa, agora em maus lençóis pela sua actuação à frente do BPN. Foi por essas e por outras (como o seu constante apoio à ideia dos sindicatos de polícias) que Cavaco Silva se opôs, com firme determinação, à sua recondução. Mas Jorge Sampaio, Secretário-Geral do Partido Socialista, compreendeu que, mesmo apesar do seu apreço sempre reafirmado por Almeida Ribeiro, havia outras considerações que lhe impunham um acordo com o Primeiro-Ministro. E Ângelo de Almeida Ribeiro também assim o entendeu, dando lugar à nomeação de Mário Raposo. Outros tempos! Foi para Estrasburgo, como membro da Comissão Europeia dos Direitos do Homem, no âmbito do Conselho da Europa, mas a doença cedo o atingiu, obrigando-o a regressar a Portugal. Sei que lamentou imenso a sua demissão mas que a compreendeu, com o sentido de Estado que sempre o caracterizou.
Por isso, estou mesmo em condições de dizer que o lugar de Provedor importa; e que Jorge Miranda seria o candidato ideal para tal cargo. O mais certo é que, com estas trocas e baldrocas, se sinta enojado e se retire... O que seria péssimo para Portugal. Mais um feito de Manuela Ferreira Leite e do actual PSD, partido do qual todo o sentido moral ligado a uma certa forma de fazer política desapareceu e que se contenta apenas com ganhos mesquinhos e ilusórios. Desculpem esta afirmaçõa provocatória mas dá a impressão de que a Jorge Miranda preferem Dias Loureiro. E, com isto, tudo fica dito!
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home