domingo, 31 de maio de 2009

Vital Moreira e o BPN

Sempre gostei de Vital Moreira, que me parece aliar uma posição claramente de esquerda (e de uma esquerda que se revê com agrado nos seus princípios fundamentais, que são a solidariedade e a igualdade ) com uma perspectiva correcta da função do Estado na sociedade moderna – e considero que esta discussão sobre as funções do Estado, num mundo em que se abateram grande parte das fronteiras entre nações (a social-democracia tradicional sempre funcionou no interior do Estado-Nação, como o conhecemos a seguir à Guerra de 39/45 e teve mesmo grandes dificuldades em aceitar o quadro da União Europeia) é a mais importante de todas as que se colocam no caminho de um projecto social-democrata credível.

Mas isso não me impede de, por uma vez sem exemplo, estar de acordo com Vasco Pulido Valente, quando ele afirma, no Público de hoje, que o candidato socialista às eleições europeias foi longe demais quando associou a «roubalheira» do BPN a «figuras gradas» do PSD e pediu a Manuela Ferreira Leite «explicações» sobre o assunto. Com efeito, se bem que, como já tentei explicar num outro comentário neste blogue, foram os governos de Cavaco Silva que, à sombra do maná dos fundos comunitários, criaram este clima de conivência entre política e negócios, esta forma portuguesa de estar na vida que se traduz no célebre «todos nos conhecemos, somos todos amigos», não é possível apontar genericamente o PSD e pretender que este partido (e não, como bem diz Vasco Pulido Valente, o senhor A ou o senhor B que, por acaso, até fazem parte dele – mas, se o problema é uma questão de limites éticos que se colocam a um político, saído do Governo para ocupar funções em empresas sobre as quais tinha responsabilidades de supervisão ou com as quais tinha contratos, há muito a dizer também de certas figuras conhecidas do PS) é responsável por ter incitado, facilitado ou escondido a enorme fraude do BPN.

(Sobre estes «enriquecidos» do cavaquismo, vale a pena ler uma crónica de José Miguel Júdice, também no Público – na última sexta-feira, se não estou em erro. Se descontarmos um certo laivo elitista, que parece querer dizer que as fortunas só têm valor se acumuladas ao longo de gerações, o que Júdice escreve merece reflexão: um conjunto de gente que só tinha como trunfo os contactos que a política lhes proporcionou enriqueceu desmedidamente. Como? Aqui há tempos, alguém me dizia que, se as pessoas pensavam que Isaltino de Morais tinha apenas cem mil contos nos bancos suíços, se enganavam profundamente: a sua fortuna era, de facto, muito maior. Mas essa mesma pessoa não parecia preocupada com o facto de um mero Presidente de Câmara, cuja família não era rica e que, quando chegara à política, quase nada tinha, ter conseguido ganhar tanto dinheiro em tão curto espaço de tempo!)

Mesmo tendo isto em conta, Vital Moreira foi longe demais. A necessidade de ganhar as eleições não justifica, como sempre tenho afirmado, que se utilizem todos os meios para destruir os adversários. O que é, afinal, o que Vital Moreira sempre prega na suas crónicas de opinião. A democracia pratica-se pela discussão das ideias, dos programas, dos projectos. Não por ataques genéricos que são, precisamente por que não se dirigem a ninguém especificamente, necessariamente infundados.

Salva-se, nesta triste história, o bom senso de Maria de Belém Roseira, Presidente da comissão parlamentar que investiga o caso BPN. Nada pior do que transformar um escândalo financeiro de enormes proporções, que coloca problemas importantes sobre o funcionamento da supervisão bancária em Portugal e que compromete, de forma quase irremediável, o prestígio de Vítor Constâncio, em arma de arremesso político. As conclusões da comissão devem ser motivadas por uma análise tanto quanto possível objectiva dos factos e não pelas situações acidentais de Oliveira e Costa e Dias Loureiro serem figuras gradas do PSD e Constâncio ter sido Secretário-Geral do PS. Por favor!