quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Face Oculta

Armando Vara rendeu-se ao inevitável e pediu a suspensão do seu mandato como administrador executivo do BCP. Com efeito, seria, pelo menos, irónico que um homem acusado de corrupção ou aceitação de subsídio ilegal pudesse continuar a fazer parte dos corpos gerentes de uma instituição de crédito. Desde o início deste processo que me pareceu que o Banco de Portugal interviria. Armando Vara, que, ao que parece e, se é verdade, para sua honra, terá comunicados aos seus colegas da administração do banco a sua intenção de se demitir imediatamente após a sua constituição como arguido no processo Face Oculta (quem inventa estes nomes?), facilitou a vida de toda a gente com esta sua decisão. Por outro lado, compreendo que peça a suspensão do mandato em vez da demissão. Com efeito, ele é arguido, não culpado. A presunção de inocência aplica-se a ele como a qualquer outra pessoa. O único problema é que, com os atrasos e demoras na administração da justiça em Portugal, esta situação corre o risco de se manter por longo tempo e não se sabe se o banco aceitará continuar a ser dirigido apenas pelos seis administradores restantes (para além de que, sendo em número par, pode acontecer que aumentem as situações em que o Presidente, Carlos Santos Ferreira, se verá obrigado a usar do seu voto de qualidade para desempatar os votos do conselho e permitir a tomada de decisões – o que não é particularmente saudável).

Goste-se ou não de Armando Vara (e eu, nem por isso!), a verdade é que ele tem um notável percurso bancário e a maioria dos que com ele trabalharam tem boa ou muito boa opinião a seu respeito. A sua situação, neste momento, e tendo em conta a forma como actua a justiça em Portugal, não é invejável. Mesmo que inocente – e nada diz que não o seja – está de antemão condenado a um processo longo depois do qual, e mesmo que seja absolvido, haverá infelizmente quem venha dizer que só o conseguiu por tráfico de influências. Se for culpado, era bom, para todos nós, que essa culpa fosse demonstrada sem sombra de dúvida e com celeridade. O que, evidentemente, não vai acontecer.

Resta-me acrescentar que a decisão de Armando Vara torna (ainda mais) insustentável a posição de José Penedos, Presidente da REN (Redes Energéticas Nacionais), e Paiva Nunes (Administrador da EDP Imobiliária), outro dos arguidos, que não adoptaram a mesma atitude e pretendem teimosamente manter-se nos seus cargos. Quanto ao primeiro, a fruta cairá de madura porque o seu mandato chega ao fim dentro de um mês e não é previsível, por muito bom que tenha sido o seu desempenho, que o Governo proponha a sua recondução. Não sei o que acontecerá a Paiva Nunes mas suponho que, mais tarde ou mais cedo, também ele se verá obrigado a pedir a demissão ou a suspender o mandato. Percebo o dilema de ambos: consideram-se inocentes e sabem que o processo se arrastará.

Nisto, bem podíamos olhar para os Estados Unidos. Lá, estas coisas resolvem-se a tempo e horas. Cá não! O novo Governo e, principalmente, o novo Ministro da Justiça, bem podia dedicar algumas horas a reflectir sobre estas questões.