quinta-feira, 19 de outubro de 2006

Prémio Nobel da Paz - Muhammad Yunus e Grameen Bank

Educamos as nossas crianças e garantimos que ganhem dinheiro para a sua educação










Não aceitamos dote para os nossos filhos nem oferecemos dote às nossas filhas. Na nossa aldeia não haverá dote – o dote é uma maldição. Não praticamos casamentos de crianças.










(Estas duas imagens, retiradas do site Grameen (http://www.grameen-info.org/) ilustram duas das dezasseis decisões colectivas que, segundo a organização, podem contribuir para o desenvolvimento.)

Para quem trabalha, de perto ou de longe (e, aqui na Comissão, é geralmente de muito longe que se trabalha) com os problemas do desenvolvimento, a decisão do Prémio Nobel da Paz deste ano não pode deixar de constituir motivo de satisfação. Com efeito, ao atribuí-lo ao economista do Bangladesh Muhammad Yunus e ao banco por ele criado, o Grameen Bank, o comité de Oslo (este é o único Prémio Nobel que não é decidido na Suécia mas, segundo a vontade de Alfred Nobel, por uma comissão nomeada pelo Parlamento norueguês) recompensa um esforço original e notável de promover o desenvolvimento numa perspectiva de baixo para cima.

Yunus (fotografia ao lado) desenvolveu e aplicou na prática o conceito do micro crédito, ou seja, da concessão de muito pequenos empréstimos a empresários demasiado pobres para poderem ter acesso aos empréstimos bancários tradicionais – considerando que os pobres e as restantes pessoas de menos recursos dispõem de competências não utilizadas e que, se desenvolvidas, se traduzirão em benefícios para os próprios e para as comunidades em que se integram. Em 1976, fundou o Grameen Bank (Grammen significa «áreas rurais» ou «aldeias» – um verdadeiro Banco das Aldeias) e, desde então, o banco concedeu mais de 5,1 biliões de dólares a mais de 5,3 biliões de beneficiários. O problema, neste tipo de iniciativas, é o de assegurar o reembolso porque, pela sua natureza mesmo, muito dos beneficiários dos créditos podem enfrentar grandes dificuldades. Assim, o banco utiliza um sistema de garantia baseado em «grupos de solidariedade», pequenos grupos informalmente constituídos que solicitam em conjunto um empréstimo global ou colectivo e que funcionam, por um lado, como garantes perante o banco e, por outro lado, como sistemas de apoio aos beneficiários individuais. Quanto ao resto, o banco funciona como qualquer outro: aceita depósitos, concede créditos hipotecários, oferece serviços financeiros. Um dado à primeira vista extraordinário é que mais de 96% dos créditos do Grameen foram distribuídos a mulheres; mas os que trabalham neste domínio sabem que o desenvolvimento das comunidades tradicionais e das aldeias depende essencialmente das mulheres que, por um lado, sofrem directamente, e sem escapatória, os efeitos da pobreza, sobre elas e sobre os filhos, e, por outro, investem directamente na melhoria das condições de vida da família o dinheiro recebido. O banco cobre, neste momento, 72.096 aldeias, correspondendo a 86% de todas as aldeias do Bangladesh.

Uma nota final para dizer que nada impede, em teoria, que o exemplo Grameen seja transplantado para sociedades mais desenvolvidas, podendo, por exemplo, ajudar na recuperação de áreas afectadas pela reconversão industrial ou na recuperação da actividade nos centros urbanos em declínio. Mas, na prática, é relativamente mais difícil encontrar nestes casos os famosos «grupos de solidariedade». O que não devia deixar de nos interpelar.

2 Comments:

Blogger Carlos said...

só não percebo porque lhe deram o nobel da paz e não o da economia.

19 outubro, 2006 17:02  
Anonymous Anónimo said...

Não és o único. O Comité foi bastante criticado por não ter atribuído o Prémio deste ano a Martti Ahtisaari, o finlandês que conseguiu a concluir um acordo de paz entre o governo indonésio e os rebeldes Gam na província de Aceh - que, para os que não se lembrem, foi bastante afectada pelo tsunami. Eu podia também ter sido algo mais crítico relativamente à ideia do micro-crédito - que não tem só aspectos positivos (a verdade é que só funciona através de subsídios, ou seja, é afinal de contas um crédito subsidiado pelo Estado mas que, pelo menos, prossegue fins úteis) - mas acho-a tão magnífica (estando farto, como estou, de subsídios destinados a promover o desenvolvimento tecnológico) que preferi esperar que alguém como tu viesse a falar deles.

20 outubro, 2006 00:12  

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