As sinfonias de Shostakovich (2) - Maria Yudina e Estaline
Shostakovich gostava de contar a história da carta que Maria Yudina, uma das mais extraordinárias pianistas russas mas que, por nunca ter saído do país, é relativamente pouco conhecida no Ocidente, escreveu a Estaline quando este lhe enviou dinheiro destinado a pagar uma sua interpretação dum concerto de Mozart de que o ditador tinha particularmente gostado. Para além de pianista brilhante, Yudina era uma dissidente que não calava a sua oposição ao regime e uma mulher de enorme força interior e serena determinação, a propósito de quem Shostakovich, que a conhecia dos tempos de escola, dizia que, para ela, «the ocean was only knee-deep», o que poderíamos traduzir (mal) por «o oceano só lhe chegava aos joelhos.»
A história é a seguinte. Uma vez, Estaline escutou na telefonia um concerto de Mozart interpretado por Yudina e pediu que lhe fosse enviada a respectiva gravação. Mas o concerto não tinha sido gravado. Preocupados, os lacaios do ditador souberam que a pianista executava de novo a obra na noite seguinte. Como é óbvio, todos os obstáculos foram vencidos, incluindo a resistência da intérprete (que, segundo dizem, exigiu ser acompanhada por um maestro da sua escolha - que os ditos lacaios foram buscar sem pestanejar, nem eles nem ele) e, de manhã, já o ditador tinha o seu disco. Para recompensar Yudina, Estaline ordenou que lhe fossem pagos 20.000 rublos. Ela respondeu-lhe por carta, mais ou menos nos seguintes termos:
«Agradeço-lhe, Iosif Vissarionovich Estaline. Rezarei por si dia e noite e pedirei ao Senhor que perdoe os seus pecados. Dei o dinheiro à Igreja…»
Diz-se que o disco de Yudina se encontrava no prato da grafonola de Estaline quando ele morreu.
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