quarta-feira, 5 de março de 2008

John Burnside e Jorge Volpi - A diferença entre ser grande e simplesmente médio

Acabei de ler Le Temps des Cendres, um livro de Jorge Volpi, escritor mexicano com predilecção por temas científicos, que será certamente traduzido em breve no nosso país. Neste romance, fala-se do fim da União Soviética e da ascensão ao poder da camarilha de liberais à outrance dirigida por Gaidar e, principalmente, Tchoubaïs, que aproveitaram as fraquezas de Yeltsin para conseguir acumular, para si e para os oligarcas que os apoiavam, fabulosas riquezas. Talvez por isso os russos se voltam hoje para Putin e os seus acólitos ou herdeiros e se declaram prestes a aceitar nova ditadura desde que a honra nacional seja salvaguarda. Mas, se o livro de Volpi nos explica algo sobre a decadência da União Soviética e sobre o tempo paralelo das fraudes e da loucura que se abateu sobre a América e Wall Street, na mesma altura do célebre filme com Michael Douglas, nessa espécie de selva onde todos se comiam uns aos outros por causa de uns graúdos tostões, a minha desilusão não foi menor. Não se trata verdadeiramente de literatura mas de uma espécie de jornalismo histórico e fictício: acumulam-se factos conhecidos, sobrepõem-se-lhes uns cenários imaginários e um enredo romântico, e distribui-se o resultado. Nada de censurável nisso – até eu gostaria de ganhar dinheiro dessa maneira – mas, desculpem, com toda a boa vontade do mundo, não se trata de literatura.

Se, pelo contrário, quiserem verdadeiros romances, leiam, como eu fiz duma assentada, com um prazer há muito inigualado, dois livros de John Burnside, autor escocês que, esses, provavalemente não encontrará editor em Portugal: Living Nowhere e The Devil’s Footprints. O primeiro, excepcional, fala-nos da desesperança e deixa-nos embasbacados diante da capacidade do autor de descrever a vida cinzenta e a violência (sem que nada disto seja contraditório) duma cidade industrial dos finais da década de setenta e a viagem da única das suas personagens que foge desse quotidiano pontuado de ácido e de morte; e o segundo é, eu diria, mais leve mas duma indescritível beleza, embora os temas sejam semelhantes: a viagem, o desaparecimento, o retorno, o repúdio do estranho e do estrangeiro. Um grande, grande escritor. Um grande poeta, também, ao que parece, e se é verdade que não conheço a sua poesia, não tenho dificuldade em acreditar que assim seja, tal a beleza das suas frases e a certeza das suas palavras. Só é pena que não seja melhor conhecido. Leiam-no...

1 Comments:

Blogger Pó dos Livros said...

Obrigado pela dica, vou indicar o nome John Burnside a umas amigas minhas editoras.

05 março, 2008 23:34  

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