João Luís - Dois anos de saudade
Devem ter existido poucos dias nas nossas vidas em que não tenhamos discutido, às vezes em altos berros, de forma a deixar a Mãe e o resto da família desesperados, sem saber o que fazer. Posso dizer que tenho saudades, não das discussões, não dos desacordos, mas de ti? Da tua ironia, do teu sorriso que nunca se transformava em riso, da tua forma de achar que o mundo não valia nada? Tenho saudades disso, de ti. Foi muito cedo que te foste embora. Mais valia que tivesses ficado algum tempo mais, mesmo com o mau feitio e aquela maneira que tinhas de te irritares sem razão nenhuma. Fazes-nos falta. Não sei bem porquê – porque, às vezes, eras insuportável – mas fazes. Devia ser essa ironia que se vê na fotografia... O sorriso irónico de que a Mãe gostava.
1 Comments:
Era exactamente assim.
Ficamos quase sempre com as últimas imagens, que tendemos a suavizar, a pintar com cores mais alegres, disfarçando áreas mais escuras que queremos esquecer, que, com o tempo, se tornam apenas pequenas pintas pretas, quase invisíveis, numa tela enormemente colorida.
As saudades que sinto, as saudades que tu sentes, daquele sorriso, do humor incomparável que possuía, da forma como partilhava connosco os seus pequenos sucessos, as suas escassas vitórias, mesmo que, sei hoje, algumas delas apenas tenham existido na sua imaginação, apenas tenham sido respostas à necessidade que tinha, que qualquer pessoa tem, de encontrar algumas pintas de cor numa tela totalmente preta.
Estão os dois seguramente juntos, a sorrir, a Mãe pode finalmente dedicar-lhe todo o seu amor sem que ninguém lhe recorde os seus erros, sem que ninguém a critique pela forma incondicional como o ama, como o sempre amou.
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