terça-feira, 17 de março de 2009

Auto-comiseração

Em mais um dos seus artigos no Público (e volto a perguntar quem lhe atribuiu esta tribuna de banalidades?), Miguel Esteves Cardoso tem um raro momento de lucidez. A sua crónica termina com esta frase: «Só peço que me dêem tempo para repensar – ou prolongar – os disparates que disse». Eu só faria duas alterações: em vez de «me dêem tempo», diria «não me dêem tempo»; em vez de «disse», poria «digo». Quanto ao resto, absolutamente de acordo.

domingo, 15 de março de 2009

De volta – com a crise financeira à vista

Muito tempo sem contribuir para este blogue. Mas isso não significa estado depressivo (pelo contrário, tenho andando em boa fase) mas quase sempre ausência de temas que me dêem essa vontade irrepremível de escrever.

A política portuguesa está em estado comatoso: uma espécie de adormecimento involuntário com pano de fundo de eleições a chegar em clima de crise económica e financeira. Nunca suportei Sócrates (nem em estilo nem em substância) mas a ideia de votar Manuela Ferreira Leite dá-me náuseas. Mais depressa votaria Jerónimo de Sousa (Paulo Portas nunca seria, para mim, uma opção; Francisco Louçã é mero disparate vestido de seminarista) se não fosse a triste convicção de que o Partido Comunista não tem, do ponto de vista político ou ideológico, o que quer que seja para oferecer a quem quer que seja. Manuel Alegre, por seu lado, é uma fraude fundada na sua evidente categoria intelectual. Mas nada do que diz se aplica à política e ao país: limita-se a denunciar, com razão, o autoritarismo de Sócrates mas, em verdade, que propõe em troca? O sonho de Alegre? Em todo o caso, nada garante que escritores ou poetas sejam bons homens de Estado. A experiência histórica milita claramente em sentido contrário. Mesmo Havel, um dos que melhor conseguiu construir essa ponte entre autores, pensadores ou filósofos e políticos, não é um exemplo de excelência, mas apenas de prática réussite. O exemplo de Bertrand Russel, ou dos Webb, ou dos vários compagnons de route dos comunistas nos anos cinquenta e sessenta, deveria bastar para nos prevenir contra esta praga.

A política internacional, depois do entusiasmo provocado pela vitória de Obama, também deixou de apresentar pontos de interesse imediato. Claro que podia comentar os diversos aspetos da crise económica e financeira mundial. Mas tanta gente há que o faz muito melhor do que eu alguma vez poderia sequer pensar (o recente artigo de Amartya Sen, “Capitalism Beyond the Crisis” na New York Review of Books, é um claro exemplo – e peço desculpa por esta (quase) tentativa de me comparar a um Prémio Nobel!) – que tudo o que eu dissesse – para além de denunciar os aspetos morais ligados à forma como poucos se enriqueceram à custa de muitos – saberia a pouco.

Maa não desespero – pelo contrário! Acredito que esta crise conduza a que possamos repensar a forma de organização das nossas sociedades – deixando de pensar que a economia determina a política e, sobretudo, que não há alternativas à completa confusão intelectual e moral em que o chamado novo liberalismo (que nem é novo nem sequer liberalismo), na sua versão de pensamento único, nos mergulhou. Mas não devemos também lançar fora o bebé com a água do banho (provérbio francês sobre o qual Sarkozy deveria refletir. O Estado não é a panaceia para os nossos males. Os burocratas (eurocratas incluídos) que, nas últimas décadas, colocaram dificuldades insuperáveis às vidas dos mais pobres e démunis, não desapareceram apenas porque falhou a iniciativa privada. É preciso encontrar um equilíbrio entre o mercado e o poder político. Esse equilíbrio passa pela defesa do modelo social europeu – se o entendermos na pureza dos seus objetivos iniciais e não no monstro burocrático a que deu origem. É preciso compreender que os ideais de igualdade e equidade ínsitos nesse modelo são também uma garantia de eficácia económica – particularmente importante em momentos de crise. Nesse aspeto, Keynes não nos ajuda muito. Sen diz que Pigou é uma guia mais seguro. Mais modernamente, Krugman pode indicar-nos aguns dos caminhos a percorrer. A via seguida por Obama (e até por Brown, na Grã-Bretanha), com todos os seus defeitos, contém elementos que podem levar à solução dos nossos problemas atuais e a uma indicação do que deve ser o sistema futuro.

Estas são as questões importantes com que devemos preocuparmos. Temo que o meu contributo para elas não passe dum conjunto de banalidades. Por isso, prefiro remeter-me a um prudente silêncio - que não significa, longe disso, desinteresse ou distância. Por isso, guardo um lugar reservado aqui neste blogue. A preencher quando achar que é necessário.

PS. Este é o primeiro dos meus artigos que utiliza as novas regras do Acordo Ortográfico! Desculpem os puristas.